Brasília - O Senado poderá rever e atualizar o projeto sobre terceirização irrestrita, aprovada anteontem pela Câmara, com a votação de outro projeto sobre o mesmo tema que deve ter mais apoio da base aliada e do governo, além de menor rejeição da oposição e do Ministério Público do Trabalho.
A decisão de colocar a matéria na pauta foi anunciada pelo presidente da Casa, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE). O texto está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e, para ir a plenário, precisa ser aprovado pelo colegiado. Segundo Oliveira, assim que a comissão analisar o texto, ele vai pautar de "imediato" no plenário da Casa.
"É preciso que a gente atualize esse projeto que foi aprovado através de outro que está tramitando no Senado. Portanto, o projeto da Câmara vai à sanção presidencial, e este outro projeto vai ser para complementar, se for o caso, o aprovado pela Câmara", disse Oliveira.
Na quarta-feira os deputados aprovaram por 231 votos a favor, 188 contra e 8 abstenções um projeto de lei que autoriza o trabalho terceirizado em todas as atividades. Um resultado considerado apertado pelo governo, com dezenas de dissidentes da base, e também preocupante porque não somaria votos suficientes, por exemplo, para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Reforma da Previdência, que exige dois terços dos 513 deputados.
Oposição vermelha
Em abril de 2015, o projeto que agora está no Senado foi aprovado pelo Plenário da Câmara por 230 votos a favor e 203 contra. A matéria apoiada por Oliveira está sob relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS), parlamentar ligado ao sindicalismo, que considera o texto da Câmara muito pior.
"É ruim para todos", disse o petista. Para Paim, ao contrário do que dizem os seus defensores, o projeto aprovado anteontem, que foi enviado pelo Executivo em 1998, vai causar ainda mais insegurança jurídica e aumentar o número de conflitos trabalhistas.
O parlamentar pediu que o presidente Michel Temer vete o texto aprovado na Câmara e aguarde a aprovação do projeto que está no Senado.
A direção da CUT chamou de golpe e "manobra espúria" a aprovação da matéria, além de criticar o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Segundo a central, em reunião no último dia 13, Maia havia se comprometido a suspender a votação do texto por pelo menos 30 dias, "para que o debate sobre a terceirização pudesse ser feito em toda a sua dimensão". Maia nega. Como resposta, a CUT fala em greve geral em abril, com mobilização nacional já no próximo dia 31.
Segundo o relator do projeto na Câmara, deputado Laércio Oliveira (SD-SE), foi aprovado apenas o que já existe. "Vamos regulamentar uma atividade que já existe e agora vai funcionar com mais segurança jurídica", disse.
Ontem, Oliveira deu uma declaração considerada machista em um debate promovido na Confederação Nacional da Indústria (CNI). O relator afirmou que "ninguém faz limpeza melhor do que a mulher", ressaltando que é do sexo feminino a maioria dos trabalhadores que atuam no segmento de serviços terceirizados.
Fim dos concursos
Além das centrais sindicais, o texto, se sancionado, será alvo de proposta de ação direta de inconstitucionalidade (Adin) a ser movida no Supremo Tribunal Federal (STF).
"O texto da Câmara é inconstitucional por permitir a terceirização no serviço público", afirmou ao DCI o procurador-geral do Ministério Público do Trabalho, Ronaldo Fleury. "É uma das mais graves por permitir o fim do concurso público, permitindo a volta do nepotismo e do apadrinhamento político na distribuição de empregos", disse. "Por exemplo, no Ministério Público Federal, apenas os procuradores não serão terceirizados".
Para o juiz federal William Douglas, embora o projeto não especifique que sua aplicabilidade ocorra no serviço público, o que garante que os concursos continuarão ocorrendo. "A Constituição Federal já estabelece que no serviço público as contratações precisam ser feitas por meio de concurso", destacou o magistrado.
Segundo Fleury, o projeto que tramita no Senado, aprovado em 2015 na Câmara, estabelece regras claras de paridade de direitos entre os trabalhadores terceirizados e os efetivos, ao contrário do texto da Câmara, que não fixa nenhum critério.
Pesa também contra o projeto da Câmara, segundo Fleury, a prorrogação do trabalho temporário dos atuais três para nove meses. "Da forma como foi feito, inviabiliza a contratação pela CLT", pontuou.
Uma das vantagens do texto que está no Senado, continuou, é assegurar a solidariedade do contratante no caso de calote por parte da terceirizada quanto ao pagamento.
"Atualmente, pelo simples fato da empresa prestadora não pagar os direitos dos trabalhadores já é suficiente para que a empresa tomadora seja demandada. Com o projeto, a empresa tomadora só será acionada depois de passar dez anos de tramitação contra a empresa terceirizada."
Fonte: DCI - SP